31 março 2012

Fukanzazengi - 54º e 55º Comentários de Coupey

Respeitem aqueles que já ganharam o conhecimento completo e que nada mais têm a fazer. Tornem-se uma só coisa com a sabedoria dos Budas e sucedam à iluminação dos patriarcas. Eis que se fizermos o zazen durante um certo tempo, isto tudo seremos capazes de realizar.

Respeitem aqueles que já ganharam o conhecimento completo e que nada mais têm a fazer. Frequentemente se compreende mal essa ideia. Isto não significa que se para de praticar e estudar o Caminho (ademais, um grande número de praticantes zen nem mesmo começaram a estudá-lo...). Isso quer dizer que eles estão além da prática e do estudo intencionais. Não caiam na armadilha sujeito-objeto, não coloquem uma cabeça em cima das suas. Estudar aqui, não é no sentido de buscar obter, procurar se desfazer das ilusões, procurar a verdade, mas no sentido de proteger, preservar.

É o que faz o discípulo zen no primeiro capítulo do Shodoka:
"Caro amigo, não vês
Este homem do
satori que parou de estudar e de agir.
Ele não descarta as ilusões, ele não busca mais a verdade."
É isto "respeitar aqueles que já ganharam o conhecimento completo": preservar, proteger o Dharma. E essa ação é a ação de todos os budas.

Essa passagem também quer dizer nós podemos alegrar-nos com a esplêndida atividade dos budas, que temos a chance de praticar juntos fazendo zazen em um dojo. É a realização do momento presente. E é também "tornarmo-nos uma só coisa com a sabedoria dos budas".

Quando Mestre Dogen fala para que "sucedamos à iluminação dos patriarcas", trata seguramente da relação profundamente íntima que existe entre os velhos patriarcas e ele, e que essa intimidade continua a existir entre ele e nós, eles e nós...


A casa do tesouro então se abrirá automaticamente, e a seremos capazes de gozar o quanto quisermos. 

Aqueles que obtiveram o segredo do satori dos patriarcas podem fazer o que quiserem com esse tesouro, eles estão livres. Um dia, Mestre Deshimaru me pediu que traduzisse (ou retraduzir) essa curta passagem do francês para o inglês. Eu a levei para casa e, quando a estudei, fui completamente tocado. Chorei. Havia naquela expressão uma tamanha liberdade...É jijuyu zanmai: tornar-se íntimo consigo mesmo, com o outro, com toda a linhagem. Não é nada de especial. É a condição normal. Zazen.

Isso me faz pensar no vigésimo-sétimo poema do Eiheikoroku do Mestre Dogen intitulado Poema dedicado aos meu discípulos:
"O vento varre o ensinamento claro e maravilhoso dos patriarcas.
No infinito, montanhas e rios se empilham dez milhões de vezes".
Quando estamos em zazen, o vento (o ensinamento dos patriarcas) escova, limpa e repassa nossa mente. E essas montanhas e esses rios que se empilham dez milhões de vezes são a paisagem de nossa vida. São coisas transmitidas sem transmissão. Sem linguagem. É o som da natureza, a voz do vale, o sermão dos seres não sencientes. É também o pio da coruja ou o canto do grilo.

Quando o zazen termina, ouve-se inicialmente o tambor que marca a hora, depois a madeira que marca o tempo que passa. E sobre essa madeira, lembrem-se, está escrita esta frase: "Se aqui e agora não resolvermos o problema de nossa cida e nossa morte, quando poderemos fazê-lo?" Escuta-se o "toc, toc, toc..." em três séries, cada vez com uma aceleração.

Zazen acabou.

Zazen quase acabou.

A vida também.

Acabou cedo.

Toc, toc, toc...

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