27 julho 2006

Sandokai - 3º Comentário de Deshimaru

O espírito do grande sábio da Índia transmitiu-se
Intimamente, diretamente, secretamente,
Do Leste para o Oeste.
(continuação)


Vejam uma história:
Un discípulo de nome Esshin levava sempre sua vaca quando ia escutar conferências. Uma noite, quando voltavam de uma palestra sobre o Hokei Kyo (Sutra do Lótus), a vaca escreveu com seu casco, na areia do caminho. este Tanka*:
"Esta noite escutei que
mesmo as ervas e os bosques,

podiam se tornar Buda.
Estou muito feliz, pois tenho um espírito."

Qual o significado destes versos?
A vaca pensava que as plantas e as árvores tinham a possibilidade de realizar a natureza Buda, mas que não tinham espírito, enquanto ela já tinha um: "Sou apenas um animal, mas eu tenho espírito e possuo igualmente a natureza do Buda. Meu Mestre deu-me hoje um ensinamento precioso. Posso compreendê-lo graças a este espírito". Mas essa vaca era uma vaca dogmática, muito apaixonada. As ervas, as árvores, as pedras, todos os elementos do cosmo possuem a natureza de Buda. Tudo é espírito, o cosmo inteiro. Todas as existências do cosmo realizam este espírito. Da mesma forma que o próprio cosmo é este espírito.
Quando estamos em zazen, o próprio zazen é o espírito do Buda e inclui todo o cosmo.
*Tanka - Poema, um pouco mais longo que um hai-kai.

21 julho 2006

Sandokai - 2º Comentário de Suzuki

Originalmente, Sandokai era o título de um livro taoísta. Sekito usou o mesmo nome para o título de seu poema que descreve o ensinamento de Buda. Qual é a diferença entre os ensinamentos taoístas e budistas? Há muitas semelhanças. Quando um budista o lê, é um texto budista, e quando um taoísta o lê, é um texto taoísta. No entanto, na realidade, é a mesma coisa. Quando um budista come um legume, trata-se de uma comida budista, e quando um vegetariano o come, trata-se de uma comida vegetariana. Ainda assim, é apenas comida.
Como budistas, nós não comemos um legume em particular por conta do fato de que ele tem alguma qualidade nutritiva especial ou o escolhemos porque ele é yin ou yang, ácido ou alcalino. Simplesmente comer comida é a nossa prática. Não comemos apenas para sustentar-nos. Como dizemos em nossa recitação da refeição, "Para praticar o Caminho, comemos esta refeição". É desta maneira que a grande mente é incluída em nossa prática. Pensar "isto é apenas um legume", não é a nossa compreensão. Devemos tratar as coisas como parte de nós mesmos, no interior de nossa prática e da grande mente. Mente pequena é a mente que está submetida às limitações do desejo ou a um disfarce emocional ou à discriminação de bom e ruim. Assim, na maior parte do tempo, mesmo quando pensamos que estamos observando as coisas-tais-como-é, na realidade, não estamos. Porque? Por causa de nossa discriminação ou de nossos desejos. O Caminho Budista consiste em nos esforçarmos duramente para deixar de lado esse tipo de discriminação de bom e ruim, deixar de lado nossos preconceitos, e ver as coisas-como-é.

13 julho 2006

Sandokai - 2º Comentário de Deshimaru

O espírito do grande sábio da Índia transmitiu-se
Intimamente, diretamente, secretamente,
Do Leste para o Oeste.
(continuação)

Quando o Mestre Niojo deu o shiho a Dogen, este já havia recebido um ensinamento bastante reservado de sete dias e sua compreensão do Zen estava concluída.
"Eu te ministrei o ensinamento da pura essência do Zen. Mesmo que tu não tenhas tomado nota de nada, tu deves te lembrar de tudo aquilo. Eu te dou o kesa e a tigela que são os símbolos do Zen, da essência do Buda transmitida por Bodhidharma. Hoje tu compreendeste, não pela tua consciência, mas pelo teu corpo, o sentido profundo deste ensinamento. Apenas tu compreendes. Os outros não apreenderam esta essência. Morrerei sem me lastimar, pois agora estou feliz."
O espírito (shin) tem o sentido do espírito do Buda. Não está, portanto, limitado ao corpo do Buda Shakyamuni; ele é o espírito universal do verdadeiro corpo universal. Este dharma kaya (corpo do Dharma) é o samadhi do rei, a natureza do Buda, sem começo nem fim, não nascido, não morto, eterno, ilimitado, infinito no tempo e no espaço. Além do ku, o ku absoluto que tudo inclui. A participação apenas da consciência para esta compreensão é incompleta e sem autenticidade. Compreender realmente, autenticamente, pelo mais profundo de nosso corpo, é a verdadeira compreensão. Compreender ku, compreender todo o cosmo, e tudo é incluído neste cosmo. Este é o espírito do grande sábio. Não é o espírito do próprio Shakyamuni, mas o espírito de todo o cosmo, de ku.

05 julho 2006

Sandokai - 1º Comentário de Suzuki

Nosso esforço no Zen consiste em observar tudo como é. Mesmo quando falamos desta maneira, nós não estamos necessariamente observando tudo como é. Nós dizemos, “Aqui está meu amigo, lá está a montanha e, lá em cima, está a lua”. Mas seu amigo não é apenas seu amigo, a montanha não é apenas a montanha e a lua não é apenas a lua. Se pensarmos, “Eu estou aqui e a montanha está lá”, isto é uma maneira dualista do observar as coisas. Para chegar em São Francisco, devemos atravessar as montanhas Tassajara. Esta é nossa compreensão habitual. Mas esta não é a maneira budista de observar as coisas. Bem aqui. Isto é a grande mente dentro da qual tudo existe.

Olhemos agora o título, Sandokai. San literalmente quer dizer “três”, mas aqui significa “coisas”. Do é a igualdade, o mesmo. Para identificar uma coisa com outra é do. Também se refere à “unicidade” ou “o ser total de alguém”, que aqui significa “grande mente”. Assim nosso entendimento é que existe um único ser que tudo inclui, e que as múltiplas coisas são encontradas em um único ser. Embora digamos “muitos seres”, na realidade, eles constituem as múltiplas partes do único ser que inclui tudo. Se você diz “muitos” é muitos. E se você diz “um” é um. “Muitos” e “um” são maneiras diferentes de descrever um único ser. Para compreender completamente a relação entre um único grande ser e as múltiplas facetas deste único ser inteiro é kai. Kai significa cumprimentar com as mãos. Você tem um sentimento de amizade. Você sente como se dois fossem um só. Do mesmo modo, este único grande ser inteiro e as múltiplas coisas são bons amigos, ou mais que bons amigos, porque originalmente eles são apenas um. Portanto, quando nos cumprimentamos, dizemos kai. “Oi, como vai você?” Este é o significado do título do poema. O que é muitos? O que é um? E o que é a unidade de um e muitos?