09 outubro 2006

Sandokai - 9º Comentário de Suzuki

A fonte original é pura e brilhante,
Sós os afluentes barrentos fluem na obscuridade.
“A fonte original é pura e brilhante”. A fonte é algo maravilhoso, às vezes além de qualquer descrição, além de nossas palavras. O que Buda transmitiu é a fonte do ensinamento, além da discriminação entre o certo e o errado. Isto é importante. O que quer que a sua mente venha a conceber, não é a própria fonte. A fonte é algo que apenas um buda conhece. Apenas quando vocês praticam o zazen, vocês a têm. Ainda assim, quer vocês pratiquem ou não, quer realizem ou não, algo existe, mesmo antes de nossa realização, que é a fonte. Não é algo que você possa provar. A fonte original nem tem gosto nem é insípida.

Os caracteres da primeira linha, Reigen myoni kokettari, referem-se a ri, a fonte do ensinamento além das palavras. A verdadeira fonte, ri, está além de nosso pensamento, ela é pura e sem máculas. Quando vocês a descrevem, vocês a limitam. Quer dizer, vocês maculam a verdade ou nela colocam uma marca. No Sutra do Coração está dito: “não há cor, não há som, não há gosto, não há mente”, e assim por diante. Isto é ri.

O próximo verso diz Shiha anni ruchusu – “os afluentes barrentos fluem na obscuridade”. Shiha significa “afluente”. Sekito diz shiha por razões poéticas: para tornar esses versos belos e para contrastar shiha com reigen, “fonte”. Reigen é mais “nomênica” e shiha é mais “fenomênica”. Dizer “numênica” ou “fenomênica” não é propriamente correto mas, tentativamente tenho que falar assim. Por isso é bom empregar os termos mais técnicos ri e ji aqui. Ji refere-se ao fenomênico – a algo que vocês podem ver, ouvir, cheirar, degustar bem como aos objetos de pensamentos ou idéias. Qualquer coisa que possa ser introduzida em nossa consciência é ji. Qualquer coisa além de nossa consciência – o numênico – é ri.

Na obscuridade, os afluentes fluem em toda a parte como água. Mesmo quando vocês não se dão conta da água, há água. A água está dentro de nosso corpo físico e também nas plantas: há água por toda parte. Da mesma maneira, a fonte pura está em toda parte. Cada ser é em si mesmo, pura fonte, e a fonte pura nada mais é que cada ser. Não há diferença entre ri e ji, fonte pura e corrente. A corrente é fonte pura, e a fonte pura é corrente. A fonte pura está correndo por toda parte, mesmo quando você não sabe. Este “não sabe” é o que chamamos obscuridade, e é muito importante.

06 outubro 2006

Sandokai - 7º Comentário de Deshimaru

A fonte original é pura e brilhante,
Sós os afluentes barrentos fluem na obscuridade
.

Esta fonte é o jorro do original, água pura e sem nenhuma sujeira.

Em zazen, se compreendemos nossa personalidade verdadeira, realizamos igualmente o que são nossas ilusões.

O Sandokai é a essência do Zen, sua dimensão é muito ampla, universal.

Se realizamos que a fonte da originalidade pessoal é ku, existência sem númeno, atingimos a compreensão de nossas ilusões e o sem-fundo da consciência infinita. A remontagem do subconsciente e seu cortejo de formações mentais nos fazem compreender a complexidade de nosso espírito e os desejos ilimitados que se elevam dos recônditos da consciência ilimitada.

Se chegamos a esta verdadeira originalidade, realizamos que nossa fonte espiritual é ku... Depois, ku torna-se shiki. A fonte espiritual brilhante e imaculada é poluída pela corrente dos fenômenos de nossa vida.

Permanecer apenas em ku: bloqueados em kontin – adormecimento – entorpecidos, tornamo-nos “demais nada”.

Ao contrário, permanecer em shiki: demais nos fenômenos, em saran – excitação - o arco se complica, fica submerso, “sujo e barrento”.

Uma água estagnada é barrenta. Uma água excessivamente remexida pelos numerosos fenômenos será igualmente suja e poluída. Devemos encontrar o Caminho do meio entre o bloqueio do kontin e a agitação excessiva do sanran.

A raiz torna-se tronco, galhos e folhas. Sobre os ramos, o broto torna-se botão, flor, fruto e, de novo, o ciclo recomeça... Não há nada fixo, é Dokan, a roda da vida, o anel do Caminho.
Ku
: Vazio. Vacuidade.
Shiki: Os fenômenos, as formas, as coisas visíveis.
Kontin: Adormecimento, torpor.
Sanran: Excitação.