29 novembro 2008

Hokyo Zanmai - 24º Comentário de Deshimaru

Os sábios de outrora deles teriam pena
e lhes ofereceriam o Dharma.
Conduzidos por suas visões errôneas,
tomariam o negro pelo branco.
Quando essas visões errôneas cessam,
a mente afirmativa harmoniza-se naturalmente.

De quê ter pena? Das ilusões, das paixões. É preciso dirigi-las, com a ajuda das seis virtudes, ou paramitas em sânscrito.

1. Dana: o dom.
2. Sila: a observância dos preceitos.
3. Kshnati: a perserverância enérgica.
4. Virya: a assiduidade.
5. Dhyana: a meditação, o zazen.
6. Prajna: a sabedoria.

É preciso ter ilusões e transformá-las em sabedoria para ajudar o conjunto dos seres vivos. Os paramitas são meios, como as cunhas de apoio que os carpinteiros colocam durante a montagem das vigas antes de fixá-las definitivamente.

Zazen não é nem Buda nem o homem, mas simplesmente sentar-se, e pensar do fundo do não-pensamento. Podemos, então, entrever e compreender as diferentes combinações do Eu, compreender que a busca pelo despertar é ilusória, que a própria vacuidade é uma ilusão, que derrete como o gelo no fogo.

24 novembro 2008

Hokyo Zanmai - 23º Comentário de Deshimaru


No exterior, a calma,
no interior, a agitação.
Como o cavalo no cabresto
ou o rato escondido.
Nosso espírito é calmo na aparência, mas, no interior, ele é só movimento. O cavalo no cabresto não pode escapar. Seu comportamento exterior parece calmo, mas, interiormente, ele deseja escapar e galopar. Do mesmo modo o rato escondido. Num canto da cozinha da fazenda, no campo, ele está com fome. Ele deseja sair para buscar sua comida. Espera, calmo na aparência, mas, no interior, é só movimento.
Bem dirigido, o cavalo forte tornar-se-á uma excelente montaria. No budismo Mahayana, não se trata de sufocar as paixões, mas saber controlá-las para que sua energia se torne uma fonte de atividade, de sabedoria e compaixão verdadeiras. Como diz o grande Mestre Shinran: "As paixões, os desejos, são a água do satori". Um grande bloco de gelo, ao derreter, dará muita água! Todas as existências do cosmo, todos os seres humanos possuem a natureza de Buda.

18 novembro 2008

Hokyo Zanmai - 22º Comentário de Deshimaru

Quando se diferenciam,
cada um possui suas normas.
Porém sejam esses ensinamentos dominados ou não,
a realidade escoa constantemente.

No Sandokai está dito: "Ligar-se à prática é ilusão". E, no Zazen Shin, encontra-se esta frase:
"Dado que esta intimidade nunca é reta nem oblíqua, ela se despoja de si mesma inconscientemente, sem autoconsciência".

As obras mais elevadas, as caligrafias mais fortes, são feitas sem artifícios, sem falsas tensões, sem finalidade nem espírito de ganho.

A propósito deste assunto, há uma história interessante.

Em um pequeno templo perdido na montanha, quatro monges faziam zazen. Eles haviam decidido fazer um sesshin em silêncio absoluto. Na primeira noite, durante o zazen, a vela se apagou, mergulhando o
dojo na escuridão profunda. O monge mais novo disse à meia voz: "A vela acaba de se apagar".
O segundo respondeu:

"Tu não deves falar, é um sesshin de silêncio total!"

O terceiro acrescentou:

"Porque falais? Devemos calar-nos e permanecermos silenciosos!"

O quarto, que era o responsável pelo sesshin, concluiu:

"Vós sois estúpidos e malvados, apenas eu não falei!"

Dogen disse: "Nossa vida é assim: uma vaca saindo do seu estábulo, os chifres, a cabeça, o corpo inteiro está do lado de fora, e o rabo continua preso na porteira!"

Mesmo que ocorra efetivamente satori, é preciso ir além, quebrar, partir o Hokyo Zanmai.

15 novembro 2008

Não busque seguir os passos dos sábios. Busque o que eles buscaram.
(Bashô - 1644-1694)

12 novembro 2008

Hokyo Zanmai - 21º Comentário de Deshimaru

Agora há o súbito e o gradual,
nos quais os ensinamentos aparecem e desaparecem.

O ensinamento de Shakyamuni é um, mas produziram-se divergências porque cada um de nós é diferente. Surgem erros, o Caminho se extravia, perdendo sua direção correta, e os discípulos não mais recebem o ensinamento em sua pureza. Assim, o Zen é um único caminho, mas um pequeno erro, ainda que ínfimo, equivale à distância que separa o céu da terra.

Desde Bodidharma até o sexto patriarca Eno, a linhagem é pura, simples e sem complicações, apenas de Mestre a Mestre. Mas, já a partir do quinto patriarca, Mestre Konin, houve cisão. Afim de testar seus discípulos, Mestre Konin pediu-lhes que escrevessem um poema. Jinshu, o mais antigo, passava por ter uma compreensão muito profunda do Zen. Eno, jovem discípulo, muito recente e completamente iletrado, sem saber ler nem escrever, não podia ser ordenado monge, e era apenas assistente do cozinheiro. O poema de Jinshu era considerado o melhor:

“Nosso corpo é como a árvore de Bodhi.

O espírito é como um espelho precioso.

Assim devemos todo dia limpar sua poeira”.

Se praticais a cada dia, acabareis por obter o satori. Passo a passo, é o Zen gradual.

Eno, o cozinheiro assistente, olhou o poema e pediu a um de seus amigos que lho lesse.

“Oh, é um grande poema, Jinshu tornar-se-á certamente o sucessor de nosso Mestre”, disse-lhe o amigo, e leu-lhe o poema.

“É um erro, respondeu Eno. Não é o verdadeiro Zen. Jamais nosso Mestre ensinou tais coisas. Eu escutei suas conferências e não acho que esse poema seja a essência de seus ensinamentos. Escreva este aqui:

“O espelho precioso não é material.

Tudo é nada. Tudo é ku.

Onde poderia a poeira se depositar?”

Eis o Zen súbito. Zazen, ele próprio, é satori, aqui e agora. Esses dois pontos de vistas, apesar de sua contradição, pareceram exatos. No entanto, foi a Eno que o Mestre Konin entregou seu kesa e sua tigela, e ele tornou-se seu sucessor.

“Deves fugir. Meus discípulos ficarão cheios de raiva contra ti. Tu compreendeste o Zen. Obtiveste o satori”.

E as duas escolas se separaram.

“O salgueiro chorão acolhe intimamente, imediatamente, os movimentos mais rápidos do vento que sopra.” Tal é o Zen súbito.