21 dezembro 2008

Feliz 2009!

De nada mais senão de dharmas verdadeiros este corpo é composto.
O momento do surgimento, nada mais é senão o surgimento do dharma;
O momento da desaparição, nada mais é senão o desaparecimento do dharma.
No momento em que aparecem tais dharmas não mais falamos da aparição de si mesmo.
No momento em que desaparecem tais dharmas, não falamos mais da desaparição de si mesmo.
Um momento antes, um momento depois: o instante não depende do instante;
Um Dharma antes, um Dharma depois, Dharma não se opõe a Dharma.

07 dezembro 2008

Hokyo Zanmai - 25º Comentário de Deshimaru



Se quereis seguir as trilhas ancestrais,
peço-vos, observai os sábios do passado.
Aquele que está a ponto de realizar o caminho do Buda
contemplou uma árvore durante dez kalpas.

No Sutra do Lótus está dito que o Buda, sobre seu assento de diamante, primeiramente praticara, sob a árvore de Bodhi, a meditação correta, zazen, durante dez milhões de anos! Observar a árvore e, ao mesmo tempo, ver em todas as direções, é Hishiryo, a realização do espírito puro, original, que cada um de nós possui no fundo de nós mesmos: verdadeira concentração do espelho precioso, o que vale dizer, o samadhi do Hokyo Zanmai. O satori de Shakyamuni influencia os três mundos, passado, presente e futuro. Nossa prática de zazen aqui e agora e a salvação futura da humanidade são duas coisas diferentes, como os dois lados de uma folha de papel!
No seu Shobogenzo, o Mestre Dogen cita esta frase de Mestre Kesan:
"Nós somos empurrados, revolvidos, arrastados pela prática do satori".
Tal é a essência do verdadeiro Zen, transmitido por um Mestre autêntico a um discípulo verdadeiro, de Kodo Sawaki a Taisen Deshimaru, de Taisen Deshimaru a seus discípulos...

29 novembro 2008

Hokyo Zanmai - 24º Comentário de Deshimaru

Os sábios de outrora deles teriam pena
e lhes ofereceriam o Dharma.
Conduzidos por suas visões errôneas,
tomariam o negro pelo branco.
Quando essas visões errôneas cessam,
a mente afirmativa harmoniza-se naturalmente.

De quê ter pena? Das ilusões, das paixões. É preciso dirigi-las, com a ajuda das seis virtudes, ou paramitas em sânscrito.

1. Dana: o dom.
2. Sila: a observância dos preceitos.
3. Kshnati: a perserverância enérgica.
4. Virya: a assiduidade.
5. Dhyana: a meditação, o zazen.
6. Prajna: a sabedoria.

É preciso ter ilusões e transformá-las em sabedoria para ajudar o conjunto dos seres vivos. Os paramitas são meios, como as cunhas de apoio que os carpinteiros colocam durante a montagem das vigas antes de fixá-las definitivamente.

Zazen não é nem Buda nem o homem, mas simplesmente sentar-se, e pensar do fundo do não-pensamento. Podemos, então, entrever e compreender as diferentes combinações do Eu, compreender que a busca pelo despertar é ilusória, que a própria vacuidade é uma ilusão, que derrete como o gelo no fogo.

24 novembro 2008

Hokyo Zanmai - 23º Comentário de Deshimaru


No exterior, a calma,
no interior, a agitação.
Como o cavalo no cabresto
ou o rato escondido.
Nosso espírito é calmo na aparência, mas, no interior, ele é só movimento. O cavalo no cabresto não pode escapar. Seu comportamento exterior parece calmo, mas, interiormente, ele deseja escapar e galopar. Do mesmo modo o rato escondido. Num canto da cozinha da fazenda, no campo, ele está com fome. Ele deseja sair para buscar sua comida. Espera, calmo na aparência, mas, no interior, é só movimento.
Bem dirigido, o cavalo forte tornar-se-á uma excelente montaria. No budismo Mahayana, não se trata de sufocar as paixões, mas saber controlá-las para que sua energia se torne uma fonte de atividade, de sabedoria e compaixão verdadeiras. Como diz o grande Mestre Shinran: "As paixões, os desejos, são a água do satori". Um grande bloco de gelo, ao derreter, dará muita água! Todas as existências do cosmo, todos os seres humanos possuem a natureza de Buda.

18 novembro 2008

Hokyo Zanmai - 22º Comentário de Deshimaru

Quando se diferenciam,
cada um possui suas normas.
Porém sejam esses ensinamentos dominados ou não,
a realidade escoa constantemente.

No Sandokai está dito: "Ligar-se à prática é ilusão". E, no Zazen Shin, encontra-se esta frase:
"Dado que esta intimidade nunca é reta nem oblíqua, ela se despoja de si mesma inconscientemente, sem autoconsciência".

As obras mais elevadas, as caligrafias mais fortes, são feitas sem artifícios, sem falsas tensões, sem finalidade nem espírito de ganho.

A propósito deste assunto, há uma história interessante.

Em um pequeno templo perdido na montanha, quatro monges faziam zazen. Eles haviam decidido fazer um sesshin em silêncio absoluto. Na primeira noite, durante o zazen, a vela se apagou, mergulhando o
dojo na escuridão profunda. O monge mais novo disse à meia voz: "A vela acaba de se apagar".
O segundo respondeu:

"Tu não deves falar, é um sesshin de silêncio total!"

O terceiro acrescentou:

"Porque falais? Devemos calar-nos e permanecermos silenciosos!"

O quarto, que era o responsável pelo sesshin, concluiu:

"Vós sois estúpidos e malvados, apenas eu não falei!"

Dogen disse: "Nossa vida é assim: uma vaca saindo do seu estábulo, os chifres, a cabeça, o corpo inteiro está do lado de fora, e o rabo continua preso na porteira!"

Mesmo que ocorra efetivamente satori, é preciso ir além, quebrar, partir o Hokyo Zanmai.

15 novembro 2008

Não busque seguir os passos dos sábios. Busque o que eles buscaram.
(Bashô - 1644-1694)

12 novembro 2008

Hokyo Zanmai - 21º Comentário de Deshimaru

Agora há o súbito e o gradual,
nos quais os ensinamentos aparecem e desaparecem.

O ensinamento de Shakyamuni é um, mas produziram-se divergências porque cada um de nós é diferente. Surgem erros, o Caminho se extravia, perdendo sua direção correta, e os discípulos não mais recebem o ensinamento em sua pureza. Assim, o Zen é um único caminho, mas um pequeno erro, ainda que ínfimo, equivale à distância que separa o céu da terra.

Desde Bodidharma até o sexto patriarca Eno, a linhagem é pura, simples e sem complicações, apenas de Mestre a Mestre. Mas, já a partir do quinto patriarca, Mestre Konin, houve cisão. Afim de testar seus discípulos, Mestre Konin pediu-lhes que escrevessem um poema. Jinshu, o mais antigo, passava por ter uma compreensão muito profunda do Zen. Eno, jovem discípulo, muito recente e completamente iletrado, sem saber ler nem escrever, não podia ser ordenado monge, e era apenas assistente do cozinheiro. O poema de Jinshu era considerado o melhor:

“Nosso corpo é como a árvore de Bodhi.

O espírito é como um espelho precioso.

Assim devemos todo dia limpar sua poeira”.

Se praticais a cada dia, acabareis por obter o satori. Passo a passo, é o Zen gradual.

Eno, o cozinheiro assistente, olhou o poema e pediu a um de seus amigos que lho lesse.

“Oh, é um grande poema, Jinshu tornar-se-á certamente o sucessor de nosso Mestre”, disse-lhe o amigo, e leu-lhe o poema.

“É um erro, respondeu Eno. Não é o verdadeiro Zen. Jamais nosso Mestre ensinou tais coisas. Eu escutei suas conferências e não acho que esse poema seja a essência de seus ensinamentos. Escreva este aqui:

“O espelho precioso não é material.

Tudo é nada. Tudo é ku.

Onde poderia a poeira se depositar?”

Eis o Zen súbito. Zazen, ele próprio, é satori, aqui e agora. Esses dois pontos de vistas, apesar de sua contradição, pareceram exatos. No entanto, foi a Eno que o Mestre Konin entregou seu kesa e sua tigela, e ele tornou-se seu sucessor.

“Deves fugir. Meus discípulos ficarão cheios de raiva contra ti. Tu compreendeste o Zen. Obtiveste o satori”.

E as duas escolas se separaram.

“O salgueiro chorão acolhe intimamente, imediatamente, os movimentos mais rápidos do vento que sopra.” Tal é o Zen súbito.

16 outubro 2008

Hokyo Zanmai - 20º Comentário de Deshimaru


Se for criada uma diferença,
Ainda que ínfima,
Não pode harmonizar-se
com o ritmo da música.


O menor errinho, e não é mais o verdadeiro Zen! Se o ritmo não está correto, a música torna-se falsa. No Shin Jin Mei, encontra-se:


"Uma diferença da espessura de um átomo,
o céu e a terra são separados".

Os koans estavam na moda na escola Rinzai. Os discípulos pensavam que o seu satori era proporcional à sua dúvida: pequena a dúvida, pequeno satori, grande a dúvida, grande satori! Eles entravam em competição sobre os koans e, finalmente, a prática do zazen perdia sua força e sua essência. De seu lado, o movimento Soto, pela importância que atribuía ao zazen, qualificou-se como Mokusho Zen: Zen da iluminação silenciosa.
O Zen autêntico é universal, em harmonia com o sistema cósmico. Pensar com a consciência pessoal, criar sem cessar categorias, coloca-nos fora do verdadeiro Zen. Além disso, Dogen recusava-se a empregar palavras como Rinzai ou Soto. Ele preferia servir-se das palavras verdade universal, ou ordem cósmica. Ele dizia igualmente: "Apenas zazen é a verdade do Zen!"

11 outubro 2008

Hokyo Zanmai - 19º Comentário de Deshimaru













A lei da interdependência e a ocasião
Podem realizar-se na claridade
E no silêncio do coração.


Nossa vida é interdependente de todos os elementos do Universo. Vós e eu, o Mestre e o discípulo, o homem e a mulher, o corpo e os diferentes órgãos, tudo é regido pela lei da interdependência.
No Zen, o método para avançar profundamente no Caminho chama-se "o Caminho do pássaro". O Caminho do pássaro não tem trajeto fixo nem indicações. Não tem traço nem marca. Enquanto um cavalo ou uma vaca, por exemplo, deixam suas pegadas no caminho, Dogen escreveu no San Sho Do Ei:
"Sem traço algum
O pato vem e vai sobre a água...
No entanto, não esquece jamais seu caminho".

29 setembro 2008


E que disseram os rubis
ante o suco das romãs?
(Neruda)
Por que o chapéu da noite
voa com tantos buracos?
(Neruda)

28 setembro 2008

Hokyo Zanmai - 18º Comentário de Deshimaru

É inocente e misterioso,
Não pertence nem à ilusão
Nem ao satori.
O sujeito oculto é o Caminho, zazen, que se pratica aqui e agora, existência universal, sem artifícios.
No primeiro volume do Shobogenzo, o Bendowa, Mestre Dogen escreveu: "Este Caminho foi fruído por cada um, mas se ninguém o praticar, ele não pode se realizar. Ele não pode ser obtido e realizado sem nossa própria certificação, autenticação e compreensão". Se não saborearmos nós mesmos a refeição deliciosa, como poderemos apreciar seu sabor? No Genjo koan, um dos capítulos mais importantes do Shobogenzo, encontra-se uma célebre história:
"Um dia, o Mestre Zen Pao Cha se abanava. Um monge dele se aproximou e fez a seguinte observação:
'A natureza do ar existe por toda a parte e o vento sopra em todos os lugares. Porque usais um leque, Mestre? Porque criais vento?'
O Mestre lhe respondeu:
'Tu apenas sabes que a natureza do ar existe por toda a parte. Apesar disto ignoras porque o vento sopra em todos os lugares!'
O monge então perguntou:
'O que quer dizer: não há lugar onde não sopre o vento?'
O Mestre continuou a se abanar em silêncio. O discípulo inclinou-se profundamente".
Esta história nos ensina que o Caminho, a energia cósmica, está presente em todo o universo. Mas se não a praticarmos com nosso próprio corpo, não a poderemos receber. O vento aqui representa o satori, a verdade cósmica, o despertar, nossa prática do zazen. Instantaneamente, e profundamente, aquele discípulo compreendeu o ensinamento de seu Mestre, fez sampai e saiu da sala. O Mestre guardou silêncio, e o discípulo, muito intuitivo, rapidamente apreendeu o pensamento de seu Mestre. Esse mondo terminou com uma reposta silenciosa.

22 setembro 2008

Ius Chasma


Ius Chasma

The Red Planet is home to Valles Marineris, the solar system's largest canyon. Within this canyon lies Ius Chasma. This image, which spans the floor of its southern trench,m was taken by the Mars Reconnaissance Orbiter. The canyon is well-known for its fine stratigraphic layers modified by wind and water.

The outcrops contain interchanging layers of dark and bright rocks. The layered deposits consist of dark basalt lava flows and bright sedimentary layers. The sediments are likely to be from atmospheric dust, sand or alluvium from an ancient water source. The layers are visible on the gentle slopes above the canyon floor, in pitted areas, and in small mesa buttes. The floor of the canyon is littered with megaripples that are aligned in a north-south direction.

Ius Chasma is believed to have been shaped by a process called sapping when water seeped from the layers of the cliffs and evaporated before it reached the canyon floor. Ius Chasma also has several structural features such as east trending normal faults and grabens that deformed the canyons. Recent geomorphological events include avalanches and minor sapping from gullies that continued to erode the canyon walls.

21 setembro 2008

Hokyo Zanmai - 17º Comentário de Deshimaru



Se estiver misturado,
Há felicidade.
Mas não devemos cometer
Nenhum erro.
Aquele que elimina as ilusões e os impedimentos, que atinge o despertar, toma consciência de que não há nehuma diferença entre o mundo da transmigração e o nirvana, entre os fenômenos e a vacuidade. A grande compaixão consiste, então, emnão procurar permanecer onde quer que seja, seja no satori, no não ter qualquer finalidade, ou se harmonizar com os outros. O individualismo talvez seja necessário para escalar a montanha, mas também é preciso descer! E, na vida quotidiana, se a sabedoria é necessária, também é preciso muita loucura!
Sabedoria e compaixão estão intimamente misturadas, perfeitamente fundidas, da mesma forma que o satori e a ilusão. Buda e nós mesmos, o mestre e o discípulo, o homem e a mulher. Esta mistura íntima, esta fusão perfeita, é a verdadeira felicidade.
O que são essa sabedoria autêntica e essa grande compaixão? Mestre Manzan responde com um poema:
"As nuvens brancas descem no vale profundo e se esvanecem,
Apenas o cume da grande montanha verde se veste no céu".
Quem são as pessoas que têm essa grande compaixão e essa verdadeira sabedoria?
"É um velho eremita de cabelos brancos.
Sua ermida está num vale profundo.
Ele sai, vai até ao mercado da pequena aldeia,
E se mistura intimamente com o povo".
"Ele não vem mais do que não vai.
Buda torna-se como uma criança".
Já se viu, Buda e o bebê têm o mesmo estado de consciência Hishiryo, mas o Buda tem a consciência suprema, enquanto que o bebê não a possui.
Hishiryo é a consciência ampla, sem limites, infinita, cósmica, além das categorias, cuja velocidade é maior que a da luz: em zazen, podemos ir até o fundo do cosmo, e pensar desde o âmago do não-pensamento.

16 setembro 2008

Hokyo Zanmai - 16º Comentário de Deshimaru


É íntimo com a origem,
É familiar com o Caminho.
Eis o caminho para nos ajudarmos uns aos outros. Depois de havermos escalado a montanha do Hannya Haramita, descemos. A subida e a descida são necessárias, sem separação nem dualidade, em completa interdependência. Da mesma forma, a compaixão e a sabedoria se abraçam, se combinam. Se uma aparece à superfície, a outra esconde-se atrás. Elas não são mais separáveis do que as duas faces de uma folha de papel.
Eis aqui a história de Mestre Shinran, Mestre tão célebre quanto Dogen, no tempo de Kamakura. Em sua juventude, Shinran era estudante da Escola Tendai em um templo da montanha Hiei, perto de Kyoto, pendente do lago. Shinran sofria bastante naquele templo, não apenas pela falta de relações sexuais, impossíveis num templo, mas também por conta da dificuldade em resolver problemas da sua vida. Cada dia, ele ia a pé até Kyoto, ao templo de Rokakudo (em japonês Rokakudo significa as seis consciências) e implorava à estátua de Kanon (Avalokitesvara). Uma noite, quando dormia diante da estátua de Kanon, Shinran teve um sonho. Uma mulher muito bonita, uma Kanon muito bela, lhe apareceu vestida em um kesa branco imaculado e completamente cintilante. Tinha em suas mãos uma flor de lótus. Ela lhe disse: "Shinran, teu destino será muito perturbado pelas mulheres... Assim devo ajudar-te e vim unir-me a ti. Serei tua esta noite, celebraremos nosso casamento e, em seguida, tu anunciarás nossa união a todos os seres humanos". Shinran foi pego de surpresa. E foi completamente incapaz de realizar aquela união, estava completamente impotente! Ele quis enxergá-la novamente, mas ela desaparecera... E percebeu uma multidão numerosa que subia o flanco de uma montanha. Seu sonho era a expressão de suas dificuldades da juventude, de monge estudante, com seus problemas sexuais. Ele os resolveu em seguida.
Shinran apaixonou-se por uma princesa deslumbrante e desposou-a. Isto lhe custou a prisão, pois ele violara os kai (preceitos) e faltara com a lei do budismo. E ele foi deportado para um lugar longínquo. Mas, durante sua estadia na prisão, realizou o método de salvação da humanidade. Tornou-se íntimo e familiar com o caminho da compaixão.
À mesma época, Dogen abria no templo de Koshoji, em Uji, um dojo acessível às mulheres, a quem era, então, proibida a prática do zazen.
Esse é um exemplo de intimidade não apenas com a fonte, mas também com o Caminho. No sonho de Shinran, a multidão escalava a montanha e, em seguida, descia. O homem religioso contempla as pessoas do alto da montanha, depois ele desce, e a elas se mistura.

11 setembro 2008


"A água é pura e por isso ela penetra as profundezas da terra. Também quando o peixe nada nessa água, ele é o Peixe".
(Mestre Dogen, Zazenshi, O Espírito de zazen, 8)
quando, quem

08 setembro 2008


"O céu é vasto e transparente até o cosmo. Também o pássaro quando voa, é o Pássaro".
(Mestre Dogen, Zazenshi, O Espírito de zazen, 9)

Hokyo Zanmai - 15º Comentário de Deshimaru


Quando o reto e o oblíquo,
Encontram-se e se prendem
(como as pernas em lótus)
Maravilhosamente há
Pergunta e resposta misturadas.


No Zen, nós olhamos, observamos a natureza como se olhássemos as imagens de uma televisão. Diante de uma tela de televisão ou de cinema, nós sentimos as emoções subjetivas, podemos entrar na televião pelo reflexo. Mas, desligado o botão, o reflexo interrompido, nossos reflexos também terminam e a televisão volta a ser simplesmente uma televisão. Agora, vivemos a natureza e, neste mundo, estamos como que olhando a televisão. É como se estivéssemos "entrados" no programa , vivêsssemos no interior. Nossa visão da criação é subjetiva. Não podemos observar a realidade objetiva. Não podemos observar a realidade objetiva porque somos sempre "reflexo". Enquanto que tudo está em perpétua mudança.

Zazen corta o contato com a televisão. Tudo se esvanece, não há mais nada, o reflexo desaparece. Depois da morte, teremos este olhar objetivo. Devemos observar uma televisão escura. Isto é um koan! Podemos ver, mas não podemos compreender o que será nossa visão depois da morte. Em zazen, digo sempre: "Observar do fundo de seu caixão". É o mundo de Hishiryo.
"Após o fogo a madeira torna-se cinza. A madeira não pode contemplar as cinzas e as cinzas não podem ver a madeira", dizia Dogen. A madeira é o mundo da natureza, da matéria viva. A cinza é a morte, o mundo do espírito. Agora, vivemos uma televisão em movimento, em seguida, veremos uma televisão sem movimento, imóvel, objetiva.

30 agosto 2008

Hokyo Zanmai - 14º Comentário de Deshimaru


[como] o vajra de cinco pontas.
No Hokyo Zanmai encontram-se cinco metáforas: o espelho precioso, o bebê, o Ying-Yang, a planta de cinco sabores e, agora, o vajra. O que significam?
A metáfora do espelho precioso remete à sabedoria da consciência Alaya, refletindo os fenômenos do cosmo tão claramente quanto um grande espelho circular (na China antiga os espelhos eram feitos de prata polida).
A do bebê evoca a sabedoria que observa a igualdade de todas as coisas depois de haver negado todas as diferenças entre os elementos.
A metáfora do Ying-Yang diz respeito à sabedoria que reconhece as faculdades de todos os seres vivos, a fim de estabelecer o dharma ao aportar uma solução para as dúvidas dos homens.
A metáfora da planta de cinco sabores corresponde à sabedoria que desenvolve faculdades elaboradas, a fim de fazer o bem a todos os seres.
Por fim, o vajra realiza a síntese da quatro sabedorias precedentes. Em tempos antigos, era uma arma de cerca de vinte centímetros de comprimento. As extremidades representavam os cinco dedos. Pode ser vista na mão esquerda de algumas estátuas de Buda, particularmente entre os tibetanos. Esse cetro de diamante simboliza a condição desperta (Bodhi) que corta todas as ilusões (bonnos). A sabedoria profunda (Maka Hannya) é, pois, representada por um objeto que tem cinco dedos nas suas duas extremidades. A mão, que participa ativamente da vida quotidiana, pode tornar-se sinal de iluninação, manifestação de energia, símbolo de sabedoria.

23 agosto 2008

Hokyo Zanmai - 13º Comentário de Deshimaru

Como o gosto da planta de cinco sabores

Este verso é muito curto. Ele diz respeito à sabedoria que permite desenvolver faculdades elaboradas para benefício de si-mesmo e de outros. Esta planta, Tisso em japonês, possui os cinco sabores: doce, salgado, apimentado, ácido, amargo. A polpa e a casca têm um gosto agridoce, as sementes e os caroços são amargos, e o conjunto tem um sabor ligeiramente salgado. Esta planta é igualmente composta de cinco cores: o caule é vermelho, a flor é amarelo e branca, os frutos no começo são verdes, e vermelhos e roxos quando maduros.
Mas, em definitivo, o gosto dessa planta é único e quase inexistente. Na cozinha zen, no Japão, a comida tem um gosto simples e leve. Diferentes sabores se combinam para formar uma ausência de sabores, que é o "gosto do Zen". A planta Tisso não tem sabor, possuindo os cinco sabores, enquanto que a água, igualmente sem sabor, não tem gosto algum. Da mesma forma, o Buda e o bebê são Hishiryo, mas apenas o Buda possui as cinco sabedorias.

10 agosto 2008

Hokyo Zanmai - 12º Comentário de Deshimaru


SHURI - Hexagrama do fogo
Ao duplicar o trigrama do fogo,
as linhas exteriores e interiores interagem.
Empilhadas, tornam-se três,
permutadas, tornam-se cinco.

Mestre Sozan emprega aqui uma metáfora baseada no sistema de adivinhação do I Ching.
No método de adivinhação bastante antigo do I Ching, usam-se cinqüenta varetas de milefólio cuja manipulação, segundo regras muito simples, produz uma série numérica que, por sua vez, dá origem a um hexagrama.
Cada hexagrama – há sessenta e quatro no total – combina traços , Yang ― ou Yin – –, e consiste na superposição de dois dos oito trigramas básicos.
Quando se joga o I Ching, as seis linhas que se obtêm interagem: há uma interdependência total entre o oráculo, o julgamento do hexagrama e a situação do consulente que manipulou as varetas, naturalmente, automaticamente, inconscientemente. O oráculo age como um espelho, ele manifesta a situação aqui e agora do consulente, no cosmo. E, assim fazendo, ele influencia a consciência e a interação.
Não obstante, o motivo do estabelecimento de três resulta em cinco. Com efeito, uma das regras muito simples que regem o I Ching diz respeito ao número de varetas que sobram depois da manipulação. Ora, se sobram cinco varetas, contam-se quatro e a quatro é atribuído o valor numérico três.
O hexagrama do fogo representa o quinto Go I, ou seja a interpenetração da essência e dos fenômenos, do vazio e da forma, de Buda e das existências etc. E a causa do estabelecimento das três bases do Go I (os dois termos da relação que os une) se transforma ela própria e resulta nos cinco princípios.
Se o ser se harmoniza com o cosmo, a consciência pessoal torna-se consciência cósmica. E o cérebro, que influencia o futuro para a eternidade, torna-se natureza de Deus ou de Buda. O cérebro, em zazen, torna-se calmo e disponível para receber a sabedoria verdadeira e profunda. Dogen nos diz no Fukanzazenji: “Pensar sem pensar...” Como se pensa sem pensar? Não-pensamento (Hishiryo). Isto em si é a arte essencial do zazen. Hishiryo é o pensamento do hipotálamo e do corpo, e não do cérebro frontal.
Hishiryo é sem nuvem e sem escuridão.
As zonas frontais do cérebro e o córtex, que correspondem às faculdades mentais e à atividade intelectual, entram em repouso, enquanto as camadas profundas do cérebro, ou o “cérebro primitivo”, e o tálamo-hipotálamo, sede da intuição, despertam-se e entram em atividade.

05 agosto 2008

Hokyo Zanmai - 11º Comentário de Deshimaru (final)

Buda não parte em direção aos fenômenos, Buda não permanece, Buda não se apega, as ações de Buda são estáveis, elas não engendram movimentos. Buda proferia seus sermões a inumeráveis pessoas, mas, na realidade, não eram sermões, mas palavras livres. As palavras do Buda são muito profundas, e sem noção alguma de categorias, palavras ilimitadas, e esta profundeza é o infinito do cosmo. Da mesma forma, os bebês não têm medo de nada, eles são livres, livres de falar. Como o Buda. Mas as palavras das crianças são gugu... dadá...
Nossa consciência deve se equilibrar entre o córtex, o cérebro profundo e o tálamo.
Em zazen, o cérebro frontal e o córtex entram em repouso, enquanto as camadas profundas, ou cérebro primitivo, e o tálamo estão ativos. O tálamo é influenciado pelos impulsos recebidos do sistema nervoso autônomo. Este sistema recebe informações procedentes dos músculos e dos cinco órgãos dos sentidos. Os músculos, em zazen, estão em estado de tônus forte, correto, exato, e exercem uma influência sobre os nervos.
Os cinco sentidos se acalmam. O cérebro chamado intelectual, sempre ativo na vida quotidiana, conhece um tempo de repouso. No mesmo momento, a casca primitiva e o tálamo entram numa forte atividade. Essas regiões do cérebro podem ser vistas, à luz da filosofia budista tradicional, como o armazém de sementes de memória. Quando pensamos em qualquer coisa, uma conexão neuronal se cria, gerando uma “ação” que se torna uma “semente” de memória no tálamo. Durante o zazen, o cérebro frontal estando em repouso, as sementes armazenadas no tálamo vêm à superfície. Podemos compreender, pelos mecanismos dos sonhos durante o sono, essas elevações das sementes armazenadas. Mas, em zazen, o cérebro não dorme, ele está engajado numa atividade exata e intensa quando nossa postura está correta. No começo do zazen, o cérebro pré-frontal e frontal entra numa fase de repouso. A consciência pessoal se esvanece e, a partir do cérebro primitivo, as lembranças antigas escondidas e armazenadas se elevam. Estas “elevações” param e depois se retomam... É o estado de Hishiryo. O cérebro está em unidade com o sistema cósmico.
..wawa... muku muku..., estas palavras correspondem ao que os bebês japoneses fazem. Mas eles não podem indicar seu objeto porque sua linguagem não apenas é sem precisão, mas também sem adorno, sem complicação. Depois, eles desejam falar e usam uma linguagem direta, não racional, não ordenada, e, às vezes, esta linguagem vai direto à fonte. É idêntico ao Zen, direto, simples e sem complicação. O Zen vai diretamente à realidade. Devemos apontar diretamente na na natureza de Buda, sem desvio, ir além do mundo da linguagem e do pensamento, além do mundo dos sentidos, estar em fusão com o sistema cósmico: é a consciência cósmica.
O Mestre pergunta ao discípulo:
- O que fazes?
O discípulo responde:
- Não faço nada.
O Mestre:
- Tu fazes o zazen mushotoku.
O discípulo, então, lhe responde:
- Se eu tivesse respondido zazen, isto quereria dizer que eu fazia zazen.
O Mestre lhe replica:
- Tu fazes alguma coisa, porque esse “não fazer nada?”
O discípulo então lhe diz:
- Mesmo dez mil Budas não poderiam compreender...
O quê significa este mondo?
Mesmo se respondermos com a linguagem, ao final, esta linguagem não é exata. Não se pode atingir o fundo da questão. Falar do fogo não faz com se sinta o calor. Falar do frio não nos refrescará.
Ainda que nossas palavras estejam corretas, o que quer que se possa dizer, isto não pode ser explicado pela linguagem. Às vezes o silêncio é mais forte que a eloqüência. Os bebês não podem falar. O Buda pode falar, ele explicou numerosos sutras e proferiu numerosos sermões, mas ele disse finalmente: “Eu não posso explicar tudo, acabei de falar, mas meus sermões não estão terminados, eles não são a verdade total”.
O Zen é plantar uma flor sobre a pedra...
É a mais elevada, a maior das sabedorias.

28 julho 2008

Hokyo Zanmai - 11º Comentário de Deshimaru (1ª parte)

É como um bebê recém-nascido
provido de seus cinco sentidos.
Nem indo, nem vindo,
não aparecendo, nem ficando.
“Gugu, dadá”, algo é dito?
Afinal, nada é dito,
pois as palavras ainda não estão corretas.

Gugu dadá são as palavras que os bebês pronunciam como mamã, papá, popô... São frases... palavras?

Os bebês não podem obter os objetos que pedem porque as palavras ainda não estão corretas. Em definitivo, temos completamente, nós também, as cinco posturas, como os recém-nascidos neste mundo: não ir, não vir, não surgir, não ficar, não falar.
Qual é o significado dessas cincos características? Sempre reencontramos esse número cinco. Cinco quer dizer acabado, completo. Com os cinco dedos, a mão está completa.
Nesse 11º poema está o problema das cinco atitudes e da linguagem. Esses versos inspiram-se no Sutra do Nirvana. O bebê não está perturbado nem preocupado. Cristo também disse: “Tornai-vos semelhantes às criancinhas”. Sua consciência é simples. Ele age automaticamente, naturalmente, inconscientemente. Ele quer se expressar pela linguagem, mas seus pais não compreendem, gugu....dadá... No começo, apenas a mãe tem a intuição da linguagem do seu bebê. As posturas não são posturas; as ações dos bebês são primitivas, portanto, inconscientes e naturais.

No Japão, uma monja célebre, Taishin, discípula do Mestre Ryokan, escreveu um poema muito conhecido. Meu Mestre Kodo Sawaki respeitava muito este Mestre que viveu há cerca de trezentos anos. Ryokan não desejava viver num templo, mas apenas numa pequenina ermida. Era mendicante, e suas caligrafias hoje, têm um valor de mercado superior às do próprio Dogen e do imperador. Sua discípula e assistente, a monja Taishin, compôs e lhe dedicou este poema:
“Se eu não o tivesse encontrado,
mesmo contando dez vezes dez,
talvez não pudesse compreender cem”.


À época de Buda, conta-nos uma história indiana, um rei, acompanhado de uma pessoa muito bonita, partiu para a montanha. Enquanto o rei dormia, a jovem mulher fugiu e foi visitar um eremita que fazia zazen numa ermida muito pequena. Este eremita recebia muitas mulheres... O rei ficou ciumento. Porque as mulheres estão em contemplação diante desse eremita?... e encolerizou-se contra ele. Foi visitar o eremita, mas ele tinha uma paciência enorme. O rei perguntou-lhe o que fazia, e o eremita respondeu-lhe:
“Eu pratico a paciência.
- Ficareis encolerizado se vos perseguir?
- Não, jamais, disse o eremita.
- Mesmo se vos matar? Perguntou o rei.
- Não”, respondeu o eremita.
Então o rei cortou-o em pedaços, pedacinho a pedacinho, os dedos, as mãos, as orelhas, as pernas...No sutra que conta essa história, o nome do rei é “aquele que corta em pedaços”, o “cortador”. Mas, curiosamente, o eremita não teve nenhuma ferida, e não morreu...
O eremita tinha uma atitude não egoísta, não pessoal... Se não temos ego, não é preciso morrer. Se nossa postura é egoísta, devemos morrer quando alguém tem a intenção de nos matar. É o que nos diz o sutra do diamante cortador. A não postura é a postura acabada, com total abandono do ego. Deveis ser como um bebê, mas isto não quer dizer ser um bebê. Os bebês são sem medo, sem problema, sem complicação, eles são muito livres, brincam francamente, honestamente, sem apego algum.

29 junho 2008

Hokyo Zanmai - 10º Comentário de Deshimaru

É como estar diante de um espelho precioso:

a forma e seu reflexo se observam.

Não sois o reflexo,

mas na verdade sois vós.




As relações que o cosmo mantém com a consciência, ou sabedoria, são as mesmas que existem entre a forma e o reflexo no espelho. Essa sabedoria é simbolizada tradicionalmente nos dojos japoneses por uma estátua do Bodhisatva Manjusri, portador da coroa da sabedoria. Sua coroa é composta de cinco Budas, representando as cinco direções, resumindo o cosmos:


1. Ao centro, Buda Dainichi simboliza o sol, a sabedoria imanente, a consciência transcendental.


2. A leste, Buda Ashuku simboliza a paz, a imobilidade, a potência e a força.


3. A oeste, Buda Amida simboliza a vida universal.


4. Ao sul, Buda Hosho simboliza os tesouros materiais (prata, outo, diamante) e espirituais.


5. Ao norte, finalmente, Buda Fuku simboliza os fenômenos.
Se abrirmos um dicionário budista no número cinco (go), ficaremos surpreendidos pela quantidade de significados a ele associados. Há os cinco dedos da mão, os Go I, os cinco elementos (céu, vento, terra, fogo e água), e as cinco sabedorias criativas:
1. Sabedoria de Hishiryo ou sabedoria do céu;
2. Sabedoria da consciência Alaya ou sabedoria do grande espelho;
3. Sabedoria da consciência Mana ou sabedoria do mundo fenomênico;
4. Sabedoria da observação que permite cortar todas as dúvidas;
5. Sabedoria da terra ligada aos cinco sentidos e à ação.
A cada uma dessas sabedorias corresponde uma atitude ilusória, um comportamento errôneo que deve ser ultrapassado:
1. Shinken: apego às opiniões, incapacidade de compreender. Assim, tendo em nosso corpo uma fonte de vida, alguns deduzem que existe uma alma (atman), que nos sobrevive depois da morte. O Buda, e depois dele Nagarajuna, dizem que não se pode colocar nem a existência nem a não existência da alma.
2. Enken: opiniões extremas. Por exemplo, crença na vida eterna depois da morte ou crença em nada após a morte. São opiniões extremas. Como saber? Ninguém nunca voltou! Ou também, opiniões categóricas no campo social, uma vez que nada nunca é totalmente branco ou preto.
“A escuridão existe na luz,
não vejais apenas o lado escuro”,
diz o Sandokai.
3. Jaken: opiniões amorais ou imorais. Alguns não sabem diferenciar o bem do mal. Outros têm más práticas.
4. Kenshin Ken: opiniões errôneas oriundas de dados incertos. Algumas práticas religiosas têm uma dimensão pouco elevada ou deságuam na mortificação. Outro exemplo: os dois erros da idolatria e da iconoclastia.
5. Kaigen Chu Ken: opiniões fundadas em preceitos errôneos. Proibições religiosas ou superstições...
A prática do zazen permite-nos cortar esses cinco tipos de erros e chegar, assim, à compreensão e à realização das cinco sabedorias. Em zazen, no começo, pensamos com cérebro pré-frontal, depois esses pensamentos do pré-frontal se esgotam, a consciência se aprofunda, penetra até o cérebro primitivo ou rinencéfalo, e a córtex entra numa fase de repouso. Em seguida, podemos atingir o tálamo, o cérebro intuitivo.

21 junho 2008

Hokyo Zanmai - 9º Comentário de Deshimaru (final)

Um discípulo perguntou ao Mestre Yakusan: "Como devemos pensar em zazen?", e Mestre Yakusan lhe respondeu: "Devemos pensar pelo não-pensamento". Então o discípulo fez uma outra pergunta: "Como se pode pensar pelo não pensamento?" E Yakusan respondeu: "Hishiryo". Depois Mestre Dogen usou esta palavra em seu kusen. "O mundo de Hishiryo é o de Buda". Silêncio absoluto, como em zazen.

Não é sem linguagem. Uma linguagem é necessária. Esta linguagem será como a de um bebê ou de um mudo. Linguagem secreta do Buda. Um monge perguntou: "De quem é o aniversário hoje?" Respondem-lhe: "É o aniversário do sogro da mulher do cunhado da irmã... Não é o aniversário de qualquer outro! Hoje é o aniversário de meu irmão!" A filosofia sufoca-se nas categorias!


Mestre Mezan nos diz: "A melodia de Bodhidharma não é uma música de flauta de cinco furos. Essa melodia vem do céu azul".


A melodia de Bodhidharma é o Zen, ela não pode ser limitada por cinco ou vinte e cinco tonalidades. Não pode, também, ser colocada numa partitura. Em plena liberdade ela foi criada no vasto céu azul. É uma música natural, sem matriz, além de todo formalismo.

15 junho 2008

Hokyo Zanmai - 9º Comentário de Deshimaru (2ª parte)




"O caminho da serpente na relva,

Apenas a serpente o compreende".



É i shin den shin - de minha alma à tua alma!



Mestre Yoka, que escreveu o Shodoka, era um monge Tendai. Depois de ter estudado o budismo Tendai, Yoka compreendeu finalmente que o verdadeiro budismo se aprendia i shin den shin com um meste autêntico. Foi então visitar o Sexto Patriarca Eno. Chegou fazendo tinir um pequeno sino preso no alto de seu bastão de monge, e postou-se de pé à frente de Mestre Eno.

Eno chamou-lhe a atenção de que um monge deve se comportar bem e que isto é importante.
"Porque estás de pé, com tua bolsa sobre os ombros? Porque manténs teu chapéu de monge na cabeça? Tu estás verdadeiramente muito mal!"
Yoka lhe respondeu:
"Tudo passa depressa. O tempo se acelera. A morte está próxima. Não posso esperar. Preciso resolver, convosco, o problema da vida."
Mestre Eno respondeu-lhe:
"Nossa vida é eterna. Devemos ir além da morte, além da mudança. Porque não fazes isto? Porque não conheces o eterno imutável? É preciso compreender os dois. Tu, tu compreendes apenas o tempo que passa depressa..."
Mas Yoka era muito forte nas discussões e, ao fim, Eno lhe diz:

"Nyoze, nyoze. De acordo, de acordo!"

E concede a autenticação a Yoka, que se enche de alegria.
"Compreendo agora i shin den shin. Posso regressar para minha casa. Agradeço-vos infinitamente, Mestre!"
Eno lhe diz:

"Fica esta noite em meu templo. Porque partes tão depressa?"
E Yoka dormiu aquela noite no templo. Desde então Yoka possui um outro nome: "O satori de uma noite".
Yoka ficou vivamente impressionado com a resposta de Mestre Eno. Essa resposta inspirou o primeiro poema do Shodoka:
"Caro amigo, não vês este homem do satori
que parou de estudar e está inativo?"
Isto quer dizer que o homem do Zen que procura a verdade interrompe os estudos e as ações conscientes, apenas pratica o zazen e, se alguém o observa, responde que tem muito tempo. Ele faz zazen. Senta-se sem se mover.
É-nos necessário ir ao Mui, ao "além", sem artifícios, insconscientemente, naturalmente. Um dia, diante de cerca de 80 000 pessoas, Buda pediu a Vima para fazer um mondo com Manjusri. Vima então perguntou a Manjusri: "O que é Mui?" Manjusri respondeu: "O Buda disse, 'Uma criança é Mui. O mundo de Hishiryo, a condição da consciência de Hishiryo, o espírito de Hishiryo são Mui".

20 maio 2008

Hokyo Zanmai - 9º Comentário de Deshimaru (1ª parte)

Ainda que não seja sem consciência,
não é sem linguagem.
Ainda que seja inconsciente,
provém da linguagem.
Isto, o dharma, pode tornar-se linguagem, até mais claro que a linguagem, pois isto está além das categorias conceituais. Não se pode explicar o que é ku. Não se pode explicar por shiki. Pode-se explicar o que é shiki pela linguagem, mas ku está além da linguagem. Shiki é visível, ku é invisível, além das categorias. Se apreenderdes, se puderdes apreender os verdadeiros fatos, a linguagem se revela inútil.
O Shin Jin Mei retoma essa idéia:
"Não é necessário falar nem usar a linguagem.
É preciso compreender por trás das palavras, pelo silêncio".
Falar sobre o açúcar não oferece o seu verdadeiro gosto. É preciso comê-lo para conhecer seu sabor. Nas minhas caligrafias, há sempre uma que representa um círculo:
"O vento puro,
A lua plena de beleza,
Impossível pintá-los".
Entre Buda e Buda, a verdade não pode ser explicada, ela está além de todas as categorias.
Entre o homem e a mulher em um leito, a linguagem não é necessária.
O Zen não necessita de linguagem diplomática. Isto se passa de espírito a espírito, mitsu, intimamente, profundamente, secretamente.
Essa frase siginifica: Devemos, no Zen, explicar o impossível pelas linguagem, explicar o inexplicável pelas palavras! É difícil explicar o Zen pela linguagem, apesar de que o Mestre o tenha feito. E Buda compreende as palavras de Buda.
"O caminho da serpente na relva,
Apenas a serpente o compreende".

11 maio 2008

Hokyo Zanmai - 8º Comentário de Deshimaru

É a Lei que governa todas as coisas.
Seu uso remove todos os sofrimentos.

Qual Lei?
"Meia-noite é a verdadeira luz.
A alvorada não é clara".
No Hannya Shingyo, encontramos: "Kan ji zai bosatsu...". Quando o Bodhisatva Avalokitesvara, para realizar a sua verdadeira natureza, praticava a mais elevada sabedoria, tendo observado os cinco skandas, ele compreendeu com uma realidade profunda que os elementos de nosso corpo e de nosso espírito são ku (realidade sem noumeno). Assim ele rejeitou todos os sofrimentos e dificuldades.
Ele disse então a Sariputra: "Neste mundo, o fenômeno (shiki) é ku, ku é igualmente shiki". Assim ku não se diferencia do fenômeno, e o fenômeno não se diferencia de ku.
"Shiki é ku
Ku é shiki".
Quando se atinge o cume de uma montanha difícil de escalar, com os músculos doloridos, os dedos danificados pela escalada, e a perspectiva de logo enfrentar riscos e dificuldades maiores na descida, não se trata de prazer, mas da maior alegria. A rigor, pode-se alcançar o prazer sem pagar o preço de um trabalho rude e penoso, mas não à alegria, esta maravilhosa centelha divina. A falta de sofrimento interdita o acesso à verdadeira felicidade.
O alimento é difícil de encontrar para os animais selvagens. Em nossa sociedade, os elementos da felicidade transformam-se em falsa felicidade. E o shiki soku ze ku não é mais percebido, as pessoas não enxergam além dos fenômenos. Devemos compreender tudo realmente, profundamente. Através desta compreensão, poderemos cortar todos os sofrimentos e oposições.
Meu Mestre Kodo Sawaki sempre dizia:
"O satori autêntico é não-ganho.
A ilusão é ganho.
O satori é satori.
A ilusão é a ilusão.
O não-ganho é o não-ganho".
Se nossa vida torna-se mushotoku, satori, nós conhecemos a verdadeira felicidade, na paz e na liberdade.