Um filho costumava acompanhar seu pai à pesca. Um dia, quando os dois estavam pescando, um peixe grande fisgou o anzol. Arrastado pela força que o peixe imprimia sobre o caniço de bambu, o pai caiu no mar. O filho pensou, “O que devo fazer? – devo ajudar meu pai... Ele certamente me diria que devo pescar até a minha morte e continuar seu karma...” Rápido, ele escondeu-se com o barco. Entrou num convento de eremitas escondido na montanha e virou monge. Mais tarde, tornado um grande Mestre, viu, uma noite, seu pai perto dele e lhe falando ao ouvido. “No momento exato que você não me retirou da água, meu karma mudou. Agora estou no paraíso e faço sampai para você”.
Observando apenas um lado, não podemos compreender, mas se considerarmos essa história à luz da fonte do espírito, ela torna-se exemplar.
No Japão antigo, alguns grandes monges faziam os transportes de dinheiro do templo de Eihei-ji. Um ladrão se pôs a segui-los, na esperança de apropriar de um grande butim. Uma noite, enquanto o tesoureiro dormia, ele entrou com passos de gato no quarto onde se encontravam o monge e o dinheiro. Abriu muito suavemente a porta e deu uma espiada no quarto antes de entrar. Ninguém. A claridade da lua inundava o quarto. Solitário, no centro da peça, um ramo de pinheiro. O ladrão, espantado, se disse, “Porque este quarto está vazio? O monge não saiu. Deveria estar aí. Eu o vi entrar no exato momento”. Recomeçou várias vezes suas artimanhas, mas, no quarto vazio, a lua iluminava sempre o ramo de pinheiro. Não ousava entrar. Decidiu-se finalmente e nada encontrou, dinheiro nenhum, apenas o ramo de pinheiro. Pensou que aquele monge possuísse um poder mágico que lhe permitia transformar-se em ramo de pinheiro, e que este poder era muito mais importante que o dinheiro porque lhe permitiria escapar da polícia. “Tenho que aprender este poder”. E, manhã alta, voltou ao quarto. Ali encontrou o monge. O ramo havia desaparecido. À sua pergunta “Onde você estava na noite passada?”, o monge respondeu, “Mas eu estava aqui! Fazia zazen, e não possuo nenhum poder mágico!” O ladrão lhe perguntou se podia lhe mostrar como fazer zazen e o monge lhe ensinou a postura.
Não devemos sofrer a influência das ações dos outros. É de nós mesmos que devemos extrair a essência.
“Saibamos apenas que quando escutamos um Mestre do Zen, não é preciso, ao escutá-lo, aduzir suas instruções às nossas concepções pessoais. Aquele que assim fizer não poderá apreender as instruções do Mestre. Quando consultamos um Mestre para nos informar sobre a lei, ele nos faz purificar o corpo e o espírito, acalmar a vista e o ouvido. Nada a fazer a não ser escutar as instruções do Mestre, sem aí misturar qualquer pensamento. O corpo e o espírito devem ser um e o mesmo que aquele do Mestre, como a água que vertemos de um vaso a outro. Apenas aquele que se tornar assim, poderá recolher o ensinamento do Mestre” (Dogen, Gakudo jin shu). Apenas tal discípulo será admitido no shiho.
O sutra do nirvana fala de um certo rei que só dizia sempre uma só palavra a seu aio: “Sandabbah” ou Arê em japonês: “Isto!”. Sandabbah para o sal, para as frutas, para a água, para selar o cavalo. Durante sua refeição o rei ordenava: “Sandabbah!” e o aio lhe trazia o sal. Sandabbah! O aio lhe apresentava as frutas. Sandabbah! Água fresca era vertida em seu copo. Sandabbah! E seu puro sangue era selado. A linguagem do rei e os tos de seu aio se encaixavam sempre perfeitamente. Sandabbah! Se o aio trouxesse o cavalo à mesa, grande erro! Ele compreendia por intuição. A educação Zen é a mesma coisa. O ponto final, shiho, significa a unidade do sangue do discípulo e do Mestre. Apenas o silêncio e, neste instante, tudo pode se transmitir.
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