23 março 2008

Hokyo Zanmai - 7º Comentário de Deshimaru (cont.)

"Meia-noite
É a verdadeira luz,
A alvorada
não é clara".
Meu Mestre gostava muito desses versos e sublinhava sua grande importância. Há trinta ou quarenta anos, Kodo Sawaki havia aberto um grande dojo no templo Dai Kyu Ji, não longe de Tóquio, em plena montanha. Cada mês, durante oito dias, ele dirigia um sesshin. Kodo Sawaki, naquela época, tinha quase a minha idade. Levantava-se cedo na manhã, por volta das três horas. O nome do dojo naquele templo: Ten Gyo Dojo, dojo da alvorada!

Nossa consciência pessoal, nossas ilusões, colocam obstáculos à nossa compreensão do sistema cósmico. Não se pode compreender a vida Zen nem pelo senso comum, nem pelo intelecto.

"Desenhar o cosmo com o polegar.
Um único dedo contém todo o cosmo".

Devemos harmonizarmo-nos com o sistema cósmico. Somos, nós mesmos, o cosmo. Intelectualmente é difícil apreender isto. Quando apreendemos o cosmo, nosso globo - incessantemente em movimento - parece tranquilo. (continua)

16 março 2008

Hokyo Zanmai - 7º Comentário de Deshimaru


Meia-noite é a verdadeira luz,


a alvorada não é clara



Este sétimo poema é a verdadeira essência do Hokyo Zanmai e, ao mesmo tempo, um koan.
"A perda torna-se ganho.
O ganho torna-se perda".

"A felicidade torna-se tristeza.
A tristeza torna-se felicidade".

"Quando obtendes alguma coisa,
Perdeis uma outra coisa.
Quando perdeis essa coisa,
Obtereis uma outra".

No Sandokai, temos:

"Dentro da luz, há escuridão,
Mas não tente entender essa escuridão.
Dentro da escuridão, há luz,
Mas não procure por essa luz.
A luz e a escuridão são um par,
Como um pé na frente e um pé atrás ao andar".

Isto é uma contradição. As pessoas à procura do Caminho não devem temer as contradições.

O kusen, ensinamento oral do Mestre durante o zazen, revela-se muito eficaz, uma vez que os discípulos estão na postura do zazen: sua cosnciência, que segue o sistema cósmico, entra no estado de Hishiryo, pensamento sem pensamento. Assim, a compreensão não vem da consciência pessoal. Não é o cérebro frontal que a registra, mas o tálamo. Esse ensinamento aí penetra inconscientemente, naturalmente, automaticamente. Ainda que não se lembrem de meu kusen, as palavras tornam-se sementes de karma. Em dez anos, quinze anos, e mesmo na hora de sua morte, esse karma poderá manifestar-se. (continua)

02 março 2008

Hokyo Zanmai - 6º Comentário de Deshimaru

Retratá-lo de modo literário,
é enchê-lo de sujeiras.



Pensar com sua consciência subjetiva pessoal é bonno, ilusão. Pensar inconscientemente, naturalmente, automaticamente (esses pensamentos que surgem do subconsciente) é igualmente ilusório. Mas esses pensamentos pertencem ao domínio do Hishiryo. Em zazen, às vezes, pensamos por nós mesmos, as ilusões surgem, e às vezes não há pensamento algum.
Durante toda a sua vida, em sua barcaça, Tokujo encontrou diversas pessoas, muitas delas tinham fisgado o anzol de sua vara de bambu. Mas, empurradas por suas ilusões, quebravam a vara querendo se livrar do anzol. Assim, incansavelmente, Tokujo ia à floresta cortar outras. E, im dia, Kassan chegou ao rio, mordeu o anzol, e foi aquele grande mondo. As respostas de Kassan, apesar de sua aparente exatidão, não estavam corretas. Deviam, por isso, brotar de suas vísceras, do fundo dele mesmo. Assim são as respostas zen.

Na matemática, o zero não pode gerar nenhum sistema numérico, enquanto qualquer outro número pode ser escolhido como base de um sistema numérico. Por exemplo, dez é a base do sistema decimal. Não importa qual vetor não nulo gera uma reta vetorial, enquanto que um vetor nulo não pode gerar outro espaço senão aquele que lhe contém. Mas, no budismo, notadamente no Shin Jin Mei, o um é igual ao todo, e as hipóteses tornam-se nulas. É ainda análogo ao Shiki soku ze ku e o Ku soku ze shiki do Hannya Shingyo. "A forma é o vazio e o vazio é a forma". No Shin Jin Mei encontramos Issai Soku. "O um é igual ao todo. O todo é igual ao um".

Pode-se dizer também:

"Tudo é nada. Nada é tudo.
A existência é Mu, nada.
O nada é a existência.
Buda é um ser comum.
Um ser comum é Buda".

Nenhuma separação:

"Deus é você.
Você próprio é Deus".

Nenhuma diferença:

"A fé é a não dualidade.
A não dualidade é fé".

A fé, em todas as coisas, é muito importante. Se não surge nenhuma dúvida na consciência pessoal, esta desaparece. Em conseqüência, na vida quotidiana, a partir da consciência cósmica, a prática de todas as coisas torna-se possível. Esta prática torna-se ela mesma satori. E não há nehuma oposição, nenhuma separação entre a prática e o satori.